11/03/2008

FARC, Chávez, EUA e Mídia

Esse texto do Prof. Emerson Leal saiu publicado no Jornal Primeira Página do último domingo (09/03). Achei interessantíssimas as ponderações do Professor. De vez em quando é bom pensar pelo outro lado - "outro" em relação à nossa mídia parda. Só pra variar, só pra fazer um exercício. Concordei com muitas reflexões do Prof. Resolvi compartilhar com todos.
Boa leitura!
Boa reflexão!

O assassinato do líder das FARC

O assassinato de Raul Reyes, comandante das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), pelo governo de Álvaro Uribe foi concebido e realizado com o apoio logístico da CIA norte-americana. Apesar de o governo colombiano tentar ocultar o caráter criminoso desta ação, fica evidente que se tratou de terrorismo de Estado.
Após a localização do grupo de Reyes por satélite ou por aeronave espiã, a CIA determinou que o exército colombiano invadisse um país estrangeiro e despejasse toneladas de bombas sobre o acampamento em que os guerrilheiros dormiam. Para entender os objetivos estratégicos desta ação conjunta dos governos norte-americano e colombiano é importante ressaltar o seguinte:
1. Se Tony Blair era o poodle europeu de Bush, Uribe é seu poodle latino-americano. Apesar de o presidente colombiano ter financiado grupos paramilitares quando governador do Estado de Antioquia e ter seu nome na lista de narcotraficantes, ele é hoje o representante maior do neoliberalismo – sistema econômico profundamente excludente – no nosso continente. Portanto, na ótica de Bush e do imperialismo norte-americano os pecados de Uribe têm de ser perdoados;
2. As Farc são – como não poderia deixar de ser – alvos constantes de campanhas de calúnias reverberadas ad nauseam pelos nossos grandes órgãos de comunicação de massa. Há quem se refira a seus integrantes como ‘narcoguerrilheiros’ ou ‘narcoterroristas’, tentando passar uma imagem de que seriam traficantes de cocaína. Nada mais falso! A função das Farcs é combater os governos subalternos aos interesses norte-americanos, em prol de um governo democrático e popular para a Colômbia. E é isso que eles fazem;
3. Na questão do intercâmbio humanitário para a libertação de reféns e presos políticos, as Farc sempre atuaram com autenticidade revolucionária, sem subterfúgios; diferentemente de Uribe, que mentia sempre e procurava abortar todas as tentativas de libertação daqueles. Num gesto unilateral, as Farc acabaram de libertar quatro deputados que estavam em seu poder. Há alguns anos atrás libertaram, também unilateralmente, 304 soldados e policiais prisioneiros das Farc;
4. Quem estava alcançando projeção internacional na questão da libertação de reféns, como interlocutor entre as partes envolvidas, era Hugo Chávez. Isto incomodava profundamente ao governo Bush. Na ótica deste grande genocida internacional, isto é a última coisa que poderia acontecer. ‘Como pode? Um ditador conseguindo resolver problemas que afligem o mundo inteiro de forma pacífica e através do diálogo!? Isso é heresia!’, diria Bush. Sua estratégia: frustrar qualquer tentativa de diálogo para tentar isolar Chávez;
5. Lamentavelmente nossa grande imprensa não faz outra coisa, senão reverberar o que a mídia norte-americana escreve. É difícil encontrar alguém que possa fazer uma avaliação correta do papel das Farc na história da Colômbia, porque as versões divulgadas pela imprensa são parciais, unilaterais e de acordo com os interesses norte-americanos: demonizar a guerrilha;
6. Raúl Reyes era o segundo homem das Farc. Foi, por assim dizer, o embaixador dos guerrilheiros. Era ele o responsável pelas conversações de paz, do lado da guerrilha. Estava negociando com a França a libertação de Ingrid Betancourt. “Foi um revolucionário exemplar, que entregou a vida pela causa em que acreditava”, como disse o secretário-geral do PC Colombiano Jaime Caicedo;
7. O canto da ‘vitória’ de Uribe e Bush não tem o condão de fazer história. Nas palavras de Emir Sader, “o jogo de Uribe é o de produzir mais sangue, como combustível para um terceiro mandato”. Quanto a Raúl Reyes, ele certamente haverá de entrar para o panteão dos heróis da América Latina, ao lado de Tiradentes, Bolívar e Che Guevara, pelo simples fato de que viveu ‘para servir a humanidade e contribuir para que ela continue’.

Emerson Leal – Doutor em Física Atômica e Molecular e vice-prefeito de São Carlos.
E-mail: depl@df.ufscar.br

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